quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Saramago é português, ponto final!

As convicções de José Saramago são bem conhecidas. Assim como a qualidade da sua escrita, reconhecida pelos leitores e pela Academia Sueca. Perante estes factos, pode-se, com toda a legitimidade, optar por quatro posições em relação ao Nobel: admirar tanto as suas ideias como a sua obra, admirar as ideias mas não a obra, detestar as ideias mas admirar a obra ou, ainda, detestar ambas.

O que não é legítimo é questionar o portuguesismo do escritor sempre que se discorda dele. E por muitos choques que Saramago tenha tido, ou venha a ter, com sectores da sociedade portuguesa, é português, ponto. Nasceu em Portugal, estudou numa escola portuguesa, escreve em português, casou-se uma primeira vez com uma portuguesa, tem uma filha portuguesa, trabalhou em jornais portugueses, foi candidato a cargos políticos portugueses. Nos últimos anos, como é sabido, tem vivido em Espanha e casou-se com uma espanhola, nada que ponha em causa a sua condição de português. Nem o próprio, apesar de iberista, alguma vez disse que resignava à cidadania portuguesa.

Como em 1992, com O Evangelho segundo Jesus Cristo, que o Governo português recusou candidatar a um prémio internacional, a polémica ressurge com Caim, que também aborda um tema religioso. Que o comunista Saramago reafirme o ateísmo aos 86 anos não surpreende, o que surpreende é a reacção indignada de figuras da Igreja Católica e a solidariedade instintiva de certos sectores políticos. Não só vivemos num país onde existe liberdade de expressão, como a separação entre Estado e Igreja está na Constituição. E isso é que é digno de todo o destaque.

Retirado do Editorial do Diário de Notícias (22 de Outubro de 2009)

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